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terça-feira, 1 de dezembro de 2009

Heroísmo





Era uma vez, um garoto que queria ser herói.Morava em Osasco, se chamava Diego.Era um exemplo de cabeça dura que não aceitava as coisas erradas.Como dizia um certo personagem de livro, tinha um quarto de bravura e três quartos de idiotice.

Sempre sonhara com heróis.Era só dar uma revista do Demolidor ou do Batman e ele ficava ali, horas e horas, vendo o combate pela justiça em um mundo frio e obscuro.Queria ter a oportunidade também de fazer aquilo.

Via na televisão: avô pula na frente de tiros e salva neto.Ou então, Gari acha vinte mil dólares e devolve ao dono.Ou até, A história de desconhecidos que doam seus órgãos a quem precisa.

Era doente, fanático por casos assim.Mais do que a confirmação de que ainda existe bondade por aí, eram amostras de heroísmo genuíno.Porque heróis são aqueles que fazem o que é certo fazer independente da circunstância ou dos obstáculo.Mas, acima de tudo isso, sempre estava a procura de uma oportunidade.Sempre.

Na vida, que só é injusta para quem permite que ela seja, ele tivera algumas dessas oportunidades.E fora ali, naquela terça feira, primeiro de dezembro, que tivera mais uma.E mais uma vez...ele não fora o herói.

Aquele dia atípico começara no médico, quando fora fazer exames para ver o coração.Estava tudo bem, dissera o médico.Gentilmente, agradeceu e foi embora.Pensou que ser gentil em situações que as pessoas costumam ser frias ou estúpidas era uma forma de heroísmo menor, talvez.Chegou em casa, viu as notícias.Suicídio em Osasco.Na estação de trem, em uma noite fria.Vira o local exato da queda.Era o local que sempre esperava o trem.O mesmo banco, a mesma plataforma.O cara estava no mesmo espaço, mas não no mesmo tempo.Queria, muito, ter agarrado ele e em seguida tê-lo socado para ver se acordava pra vida.Não importa se ganharia uma notinha no jornal regional, importa que se sentiria melhor, mais útil, mais próximo dos sonhos.Mas não estava lá.E naquela noite, alguém perdera a vida de forma lamentável.

Continuou na internet.A garota (aquela garota, dos olhos cinzentos e bonitos) entrou.Foi uma conversa nem rápida nem longa.Fez ele querer mais, mas não haveria.Seus pais voltaram do aeroporto.Estava atrasado.Tinha que sair para o trabalho.Pegou o primeiro ônibus que veio.Lotado.Havia uma criança na sua frente, e ele estava bem perto da catraca.Infeliz posição.Todos que passavam, queriam passar para um espaço que não era disponível.E queriam passar empurrando ele.Mas havia uma criança na sua frente.E, por quarenta minutos, ele aguentou cotoveladas e todo tipo de olhar torto para evitar machucá-la.Mas, isso não era heroísmo.Era pouco demais para ser.

Percebeu que o trânsito era caótico e que não iria chegar a tempo se continuasse ali.Desceu do ônibus, e havia uma avenida inteira, inclinada, para chegar no trabalho ainda.Faltavam vinte minutos.De carro, geralmente eram dez.Não pensou mais.Subiu correndo a plenos pulmões.O sol lhe doía como o fogo que arde sem se ver (e que ardia por um certo alguém), e na metade do caminho suas pernas doíam tanto e estava tão dura que ele passou a quase marchar para não ter que parar.Chegara ao trabalho na hora.Esse fora o quase heroísmo particular do dia.Mas não, ainda não era tudo isso.

Então, abriu o laboratório de informática pros alunos, arrumou o que tinha de arrumar e sentou no computador.Estava vendo as notícias do dia (a nova presidência da União Européia causara rumores de insegurança, um prédio residencial pegara fogo em São Paulo, e o governador do distrito federal resolvera coçar o saco com um maço de notas de cem), quando uma aluna viera pedir ajuda.Uma outra aluna estava passando mal.É agora, pensou consigo mesmo.Foi até lá, com o ímpeto de quem vai proclamar a independência (talvez porque seria estranho se gritasse "ou morte" ao tentar socorrer alguém em público), e se deparou com uma pessoa se retorcendo e chorando desesperada.É agora, pequeno bastardo.Tentou conversar, mas não entendeu muita coisa.As pessoas na sala o olhavam como quem olham uma divindade a lhes dizerem o que fazer.Pensou rápido e prático.Não sei medicina, não sei primeiros socorros.Chutaria apendicite, mas que merda isso iria resolver ?

Entrou na sala, chamou a inspetoria e a enfermagem, que (felizmente, para o alívio geral) chegaram rapidamente.O inspetor chegou e perguntou de forma concisa e educada : O que ela sente ?

Dissera sobre as dores abdominais e a impossibilidade de andar.Ele então se agachou na frente dela, segurou nas mãos do ser que se contorcia, e, olho no olho, disse com voz branda porém firme : Qual o seu nome ? Tudo bem ? Vai ficar tudo bem, eu estou com você, iremos cuidar disso rapidamente e até o fim do dia você estará bem.Você confia em mim ?

Ela acalmara, mas a cara ainda se retorcia em espasmos de algo que realmente deveria estar doendo.E então, o garoto que sonhava ser herói sonhou sumir dali.Porque eu não fui assim ? Porque eu fui só uma ponte, porque eu não fui homem o suficiente de dominar a situação, e agi como um garoto assustado que chama pelos adultos quando as luzes apagam e ele ouve vozes ?

A garota se foi nos braços dele, e a oportunidade junto.Podia sentir o olhar dos outros, decepcionados com a falta de liderança e atitude.E então, o garoto que queria ser herói se tornou figurante, e o vilão não existia.E o garoto que queria ser herói, admirou o homem que a salvou.Queria ser ele.Assim como queria ter a determinação de Ayrton Senna, a paciência de Gandhi, o amor de Cristo, a coragem de Martin Luther King, a liderança de Alexandre Magno, os olhos frios e matadores de Roland Deschain.Mas ele não tinha ali, naquela hora.E não era questão dele se aceitar como era ou não.Ele sabia que poderia ser tudo isso, salvo as proporções.Do jeito dele, ele poderia.Mas não fora.Nunca fora.E naquele dia, o garoto que queria ser herói não foi.


Amanhã, será outro dia.E ele poderá se sentar no sofá e ligar a tv nas notícias sem ter que torcer a boca em um muxoxo de quem não aguenta ver um mundo e ter uma vida na qual nada parece estar certo.Ele poderá ser o herói de alguém.Seja no jornal das oito, seja na memória de alguém.

Amanhã.


AD INFINITUM, Caros Raros

12 comentários:

Adriano disse...

Nossa O.O

Isso aqui foi mto bom "Na vida, que só é injusta para quem permite que ela seja"

Thais Sant'Ana disse...

Você não sabe reconhecer o bem que faz as pessoas.

é isso Diego !

Thais Sant'Ana disse...

Talvez seja tudo um processo... primeiro precisamos ser heróis nas pequenas coisas, nos pequenos conflitos,( uma briga com um irmao que a gente consegue evitar, um bom conselho que damos a um amigo, a luta pra não deixar que se instale em nós mágoa, ódio, por ninguém. )... e no pouco, no mínimo, nas causas que normalmente a maioria não se empenha vamos sendo preparados para algum dia enfrentarmos algo maior.

Maria Carolina disse...

Lindo texto Diego!
Eu sei que é uma heresia para a arte, mas a história do suicídio na estação é verídica?!
Falando sobre o heroísmo, às vezes me sinto inferior por não ter estes um quarto de bravura e três quartos de idiotice... Às vezes acho que penso demais em mim mesma, como a maioria das pessoas. Heroísmo pra mim é isso, fazer pelo outro... puro altruísmo! E esta característica, ainda que em pequeno grau, em qualquer pessoa, é digna de adsmiração... Pq nos une, seres humanos... Somos todos ligados por um fio.. temos que fazer pelo outro :)

Diego disse...

Carol :

É verídico sim.Ocorreu no dia 30/10, na parte da noite.Não sei aproximar a hora exata, pois não saiu (nunca sai) nenhuma notícia a respeito, mas eu fiquei sabendo pelos bastidores do pessoal da CPTM (conheço alguns) e o vídeo foi postado no youtube.Não tem sangue nem nada, mas mostra claramente um corpo ali do lado da linha, e o pessoal do SAMU botando o pano em cima, além de também aparecer ao fundo a entrada do estacionamento da rodoviária.

ReLiver disse...

Essa foi a coisa mais idiota que já li. Um homem é héroi quando da valor à vida. Quando gosta de viver e cuida de si mesmo. Heroísmo conciste em seguir a vida de cabeça erguida. Você ajudou muito a menina que estava passando mal. Saiba que tem gente que ignoraria. Se não fosse você chamar, demoraria mais ainda e a menina sofreria mais. Você não segurou o rapaz que se matou? De que adianta segurá-lo? Ele provavelmente já estaria morto em vida. Sem desejo de viver. ACORDA! Você é herói opr estar vivo e andar de cabeça erguida. Enfrenta seus problemas. Quer salvar alguém? Salve a ti mesmo! Corra para o SEU sonho. Salve a sua vida! E quando puder, faça uma caridade. ;)
Eu estou lutando pela minha vida, então se preocupe em lutar pela sua. Você será um herói sendo justo e viver com a cabeça erguida. Deixe para os médicos, policiais, bombeiros, entre outros, ajudar pessoas.
Uma pessoa que salva a ti mesmo e age de boa fé, contribue com toda a humanidade! ;D
Depois passa no meu blog... Tem novidades do meu tratamento.

Diego disse...

Sua critica foi realmente construtiva, guri ^^


Adorei mesmo, seu comentário =]

Unknown disse...

O maior herói é aquele que, mesmo num mundo egoísta, para ao menos pra refletir em relação à outra pessoa/coisa...pensa nisso!

Bru disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Unknown disse...

São seus pequenos atos heróicos que lhe tornam essa pessoa gigantesca que você é.

Quisera eu que as pessoas 'normais' do mundo tivessem essa alma de herói que você tem.

Não se apequene, Diego.
Você é uma pessoa de infinitas qualidades - e de um coração enorme.

Você é herói de muita gente, sem sequer saber.

Jonny disse...

Meu caro sobrinho, a vida é simples o ser humano é que complica tudo.

Os falsos heróis estão por todas as partes.

Ontem ouvi de uma senhora de 60 anos... Perua, chique, bem humorada dizer: A vida é: Comer bem, porque logo em seguida você vai mandar tudo pra fora, viajar porque é o que você guardará pra sempre na memória, e o sexo, que é a melhor coisa do mundo... achei o máximo por se tratar de uma linda senhora de 60 anos e por resumir inúmeras coisas que queremos em 3 ações. Fica a pergunta, para que complicar o simples? O verdadeiro heroísmo está nas coisas simples, não precisa de manchetes, platéia e purpurina. Um bom dia em família, uma boa tarde aos amigos, ou “Oi, lembrei de você” podem salvar vidas.

Então S I M P L I F I Q U E, faça a sua parte, porque as demais alegorias, a vida se encarrega de determinar o seu lugar ideal.

putresco disse...

Um herói precisa ter uma motivação, um background. Não adiante sair dando porrada em tudo que é bandido(adiantaria muito para falar a verdade), ele tem que SENTIR a dor dos outros, se não não é herói, é só um robô movido por conceitos pré-estabelecidos dos homens.

Você tem carne e sangue, já dá para fazer um churrasco e sarapatel. Aposto que a garota gostou de como você chegou perto dela. Eu teria esquecido a dor na hora e teria me apaixonado. Mas como não sou gay nem nada, portanto, eu não fico.


É isso aê, Jesus não disse "Usais cueca por cima da veste e combatas o crime onde quer que vos ache", ele revolucionou o modo de pensar e de amar de um grupo de toscos ocos. E foi útil quando podia.


Seu caro raro leitor nºone.