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quinta-feira, 16 de julho de 2009

Pensamentos.












Meio dia.Acordo.Tomo banho.Almoço, termino de me arrumar, saio de casa, cruzo a rua, chego ao ponto, espero cinco minutos e entro no ônibus.Vinte minutos depois, desço.Blusa de lã preta, all star folgado, calça jeans, cabelo amassado, bolsa nas costas.Chego ao trabalho.

Todos estão animados comendo e conversando.
Animados.Cumprimento conforme etiqueta e me dirijo á minha mesa.Realizo as verificações de praxe.Você tem dois novos e-mails em sua caixa de entrada.Um agradecimento, um spam.

Entro em meu pequeno vício on line, leio as notícias, atendo um aluno.Ajudo outro funcionário a conectar uns cabos velhos, tão velhos quanto aqueles prédios.Sinto cheiro de gente antiga por lá.Volto, e percebo que mal a tarde cai o sereno vem junto.Entro no Msn, tento conversar, me bate um vazio.Se passaram duas horas.Ontem havia conhecido uma garota legal e assistido um filme interessante.Hoje, só sentido tristeza, uma tristeza tão sensata quanto queimar nota de cem.E nada mais.Saio, observo o velho da manutenção com a vassoura passar xingando algo.Desço as escadas, andar por andar, na tentativa de arejar a cabeça.

Mente Vazia, Oficina do Diabo.Há algo apertando dentro de mim, e eu não consigo achar ninguém para conversar ou sorrir.Só as paredes.Meu chefe está entretido assistindo seriados.Meu colega saiu para fumar.Frio, frio demais, mas não é isso que me incomoda.É um frio aqui dentro.Solidão.

Horas se arrastam, intermináveis, incontáveis.Alguém faz amor do outro lado da cidade, outras pessoas dão risada em uma pizzaria, um enfermeiro está fechando a fratura exposta de um infeliz na emergência do hospital municipal.A cada minuto no mundo, vinte crianças morrem de desnutrição, três pessoas morrem de acidentes de trabalho, quatro pessoas morrem de AIDS, um brasileiro morre de problemas com o tabaco, e uma grávida morre de complicações no parto.

Meu amigo de infância deve estar dormindo, minha amiga se matando em uma prova, o presidente de uma empresa fechando um contrato e alguma pessoa que eu cruzei na rua hoje, jantando e assistindo Jornal Nacional.Minha cachorra deve estar rolando no meu cobertor que vai estar fedendo quando eu chegar, meu pai deve estar reclamando de algum bandido que apareceu na televisão, minha ex deve estar namorando e minha avó deve estar lembrando do meu avô falecido.O segurança da portaria com certeza acabou de olhar para os dotes da mulher que passou, que deve estar pensando no cara legal que a chamou para sair, que deve estar pensando em ligar para aquela guria interessante da internet.O motorista do ônibus que passa provavelmente está pensando em chegar logo em casa, tanto que até é perigoso esquecer alguém no ponto.O indigente pensa quanto tempo vai levar pra conseguir comida de novo, e eu acho mesmo que aquela mulher que passou com a mão no colo do cara dentro do Opala 87 na minha frente estava pensando em passar um tempo pago em um lugar discreto.

Eu ? Eu estou pensando em...estive pensando em comprar notebook, em tirar carta, em arrumar um bico de professor e naquele momento eu pensava fortemente em porquê me sentia tão mal.

O expediente acabou.Espero no ponto, observo a garota da biblioteca passar e os caras do financeiro comentarem algo.O legal é que ela dá mais bola para eles.Será que ela sabe o que eles querem fazer com ela, e que é só por um dia ?

O ônibus vem, eu pego com o meu colega.A garota sentada perto do banco alto olha pra ele, ele retribui, e no melhor estilo câmeramen, eu observo tudo quase parado em frente os dois.Conversas perdidas sobre os times do campeonato, só para passar o tempo até chegar em casa.Agonia maldita, veio daonde ?

Desco, chego em casa, passo a mão na cabeça da cachorra profanadora de cobertores e digo oi para meu velho.Sento ao lado, e me preparo para a partida de futebol.Não me sinto em paz, o que é um pecado, nossa casa deveria ser nosso local de repouso mental.

Deitei no sofá e assisti confortavelmente a vitória do meu time.105 minutos de alguma emoção e algo próximo de satisfação.Cento e cinco minutos.Duas mil e cem crianças morreram de fome, o motorista provavelmente chegou em casa, meu amigo deve ter acordado e está ouvindo música, minha amiga terminou a prova, o cara do Opala deve estar molhando o biscoito, assim como minha ex, e putz, eu acho que o indigente não só ficou na mão como deve estar se cagando de frio.

Não sei quem foram as cento e cinco grávidas que não tiveram a alegria de ser mãe, nem os quinze que morreram praticando o ofício, mas acho que uma quarta feira fria é um bom dia para um velório, com exceção das pessoas na pizzaria, das que molham o biscoito, das que ouvem musica, das que usam o orkut e das que tem blogs e escrevem tudo que observaram aqui enquanto crianças morrem de fome.Opa, é uma e cinquenta...Quinta Feira.

Como foram os seus minutos ? E seus pensamentos ?



AD INFINITUMN

3 comentários:

putresco disse...

Um dia ainda terei um Opala 87...




Seu caro raro leitor nºum.

Unknown disse...

é, sua amiga estava na prova, se ferrou e teve de assistir aula em pleno sábado (nem sei se era de mim que você estava falando... hehe)

pessoas e coisas estranhas nos arrodeam o tempo inteiro... algumas chegam a ser divertidas..
outras, trágicas.
a ordem egoísta e natural das coisas: metade da riqueza do mundo com 1% da população, enquanto bilhões agonizam de fome e frio.


quando criança eu não me sentia tão impotente assim, jurava que o mundo era o paraíso, não imaginava que houvesse tanta coisa pra mudar.

hoje sei que tem, e as coisas que posso fazer são ínfimas diante do tamanho do problema..

me ajuda, Di? duas cabeças pensam melhor do que uma.

Anônimo disse...

eu não sei onde estão meus pensamentos...

estou doente e acho que nessas horas não se sai muito de casa e não se pensa em nada além de querer que pare de doer o pulmão quando se respira ou a cabeça quando se tosse...


aliás, muito boa divagação de uma quinta feira.