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quinta-feira, 4 de novembro de 2010

O Fim da Vida






Hoje observei, em silêncio, o pôr-do-sol.


Fiquei pensando como essa hora do dia é sempre linda, calma, única.E como tem um quê de melancolia ver uma estrela de bilhões de quilômetros quadrados se apagando lá no horizonte, dando lugar ao vazio da noite.


Meus pais sempre trabalharam muito.


E por isso, fui criado a maior parte da infância pela minha avó.Praticamente minha segunda mãe.


Eu nunca consegui retribuir completamente aquela quantidade enorme de amor.Eu sempre fui apenas o planeta Terra perto do Sol chamado Júlia.


Embora ela se dedicasse a me iluminar e aquecer, eu não fazia o mesmo por ela.E ela me amava demais, ainda assim.


Ás vezes, eu chegava no fim de semana estressado e triste por ter enfrentado situações muito ruins com outras pessoas.


Lembro de uma vez que fiquei muito tempo sem visitá-la, pois além de estar muito ocupado durante a semana, eu estava bem abalado pelo término do meu primeiro namoro e por sofrer uma certa exclusão social na escola.


Estava me tornando uma pessoa fechada por apanhar da vida.


Então, visitei minha avó, porque meus pais me obrigaram.Embora eu gostasse muito dela, eu não sentia a mínima vontade de sair do meu círculo anti-social.


E a minha avó me recebeu de braços abertos e exclamando : "Meu neto !".


E eu senti vergonha demais de mim.Não sentia merecer tudo aquilo.


Os anos foram passando, e minha avó foi sofrendo abalos.A morte de meu avô, pra quem já havia perdido um filho, foi aumentando a tristeza de minha avó.


E eu, como neto, afilhado e quase um filho, sentia uma parcela nisso.Eu deveria estar lá, por ela !


Passava noites acordado me remoendo de culpa por não vencer minha barreira e ir lá ser um neto mais presente.


Minha avó, ao contrário da maioria, não me repudiava por conta da minha mudança de neto expansivo e amoroso pra homem frio e racional.


Apenas deixava claro que sentia saudades do antigo.Mas que me amava muito, e sempre sorria logo em seguida.


Se existe alguém no mundo que nunca, nunca mesmo, me machucou ou me fez mal, mesmo vivendo tanto comigo, foi minha avó.


E por isso, acostumei a enxergá-la como alguém intocável, imortal, imaculada...


Quando minha avó chorava, eu tentava colocar na cabeça que ela ia superar a perda do Vô Antônio.Ás vezes encostava nela e falava algo, pra tentar desviar o pensamento dela.


Então, minha avó foi adoecendo.


Caindo na rua, esquecendo das coisas...Mas não esquecia de sorrir pra mim.Em um mundo que eu tinha que lutar pra conseguir levantar a cabeça no meio da multidão, ela era sempre uma mão estendida.


Achei fotos perdidas com ela no computador, revelei todas elas e estava guardando pro aniversário, em novembro.


Eu, não sei bem porque, senti vontade enorme de fazer daquele aniversário o melhor pra minha avó.


E, como peça do destino, fiquei sabendo hoje que minha avó está com Mal de Parkinson.E que a saúde está realmente debilitada.


E eu, que havia comentado com várias pessoas que tenho me sentido na fase mais estável e produtiva da minha vida, senti o mundo acabar.


Fui pro quarto, e segurei as lágrimas.


Porra, minha avó não !


Então o arrependimento pelos sábados trancados no quarto em vez de compartilhados com ela veio galopando.


E eu fico aqui pensando, como vai ser a vida sem ela.


Minha avó é uma daquelas pedras angulares, que você acha que não vai derrubar todo o seu castelo até ela sair rolando e tudo vir abaixo...


Eu não sei.


Só sei de uma coisa.


No dia oito de novembro, vou estar lá, passando com ela, com fotos, bolo e lembranças.


Irei levar uma rosa, como eu levava quando criança, pra ela botar no meio dos livros e mostrar pros outros depois de meses a rosa que o neto deu.


E eu vou dizer muitos te amos, e muitos abraços.


Vou compensar só um pouco da minha ausência.


Eu falhei no passado, vó, e acho que doer como dói é um preço justo.A vida é uma eterna luta, e estamos aqui de pé, não é ?


Se você não tivesse me demonstrado o amor, que tipo de pessoa eu seria hoje ?


Se um dia eu realmente for alguém que melhorou o mundo, parabéns a você.Se um dia eu realmente for alguém que salvou uma vida, que essa vida seja grata a você.


Eu posso ser um idiota de cara fechada e sem capacidade total de demonstrar meus sentimentos.Mas eu nunca vou parar de viver, em honra ao que você me ensinou.


E quando você se for, eu espero mesmo que Deus te receba bem, porque senão eu vou ficar muito puto mesmo com Ele.Aliás, ele não é injusto, então ele vai receber bem.Você tá avisado, seu mané.


Espero que seus dias por aqui terminem muito bem, e espero que você veja lá do outro lado seu neto fazendo coisas boas por aqui.Assim, você terá mais do que rosas em livros pra mostrar pros outros.



Eu amo você !




AD INFINITUM



3 comentários:

Mybiggestmistake disse...

Avós são poços sem fim de um amor inexpressável...sim, é o mimo mais doce e o carinho mais sincero.
Digo com certo receio e resquícios de vergonha de menina boba e chorona que me encantei com sua declaração.
Sua vó é uma pessoa feliz por ter mesmo que só parte sua por perto.
O fato é que ela estará bem...onde quer que esteja, o contrário se faz impossível. Aprume tua calma...

Oissac disse...

Parabéns para sua avó. Esse Amor incondicional, que você sabe que existe na sua vó, é o Amor de uma Mãe pra com um filho. Pois ainda que o mundo acabe, no fim eles querem apenas a nossa plena felicidade. E é essa dedicação Amorosa que move nossos corações imperfeitos em busca, desta mesma felicidade e dedicação. Os avós são níveis maiores de pais!
Parabéns pelo seu post!!!!

Anônimo disse...

Sabe... Com a morte do meu pai em setembro, eu senti boa parte do que você descreveu aqui...

Ele nunca foi um ser imaculado, por não permitir que entrassemos em sua vida, que ele aparentemente queria esquecer, mas era especial do seu jeito. Sei que ele me criou da melhor maneira que pode e isso já é uma grande coisa pra se lembrar e guardar com carinho...

Aí de repente, quando percebemos, ele está internado... Piorando a cada dia e dentro de uma curta semana, nos deixou.
Fico em paz por ele ter ido, pois o sofrimento era grande. Mas não fico tão em paz assim porque não o amei tudo que poderia ou deveria nesses últimos anos...